Manifestações e covid-19: é possível reduzir os riscos em atos de rua na pandemia

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Com a pandemia matando milhares de brasileiros todos os dias, deterioração das condições econômicas e a indignação crescendo com os depoimentos na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia de covid-19, cresce a discussão sobre a realização de manifestações contra o governo de Jair Bolsonaro, mesmo em meio à pandemia de covid-19. Especialistas em saúde e pesquisadores da covid-19 são categóricos: em uma situação de pandemia, não se pode falar em segurança total, mas, sim, é possível realizar manifestações com uma redução bastante significativa dos riscos, desde que sejam utilizadas máscaras de boa qualidade e haja boa organização nos atos.

O físico, pesquisador na Universidade de Vermont e membro do Observatório Covid-19BR, Vitor Mori, destaca que, qualquer atividade ao ar livre, como manifestações de rua, apresenta risco menor de transmissão da covid-19 do que em ambientes fechados. Com uso de máscaras do tipo N95 ou PFF2, esse risco continua existindo, mas é ainda menor. “Não dá para dizer que é 100% seguro, que não tem risco nenhum. Qualquer atividade que envolva um grande número de pessoas, envolve certo risco. Mas pelo fato de estar em um local ao ar livre, bem ventilado, de máscara, a chance de transmissão é muito baixa”, afirmou.

Ação necessária

A infectologista e dirigente do Sindicato dos Médicos de São Paulo, Juliana Salles, concorda com a avaliação de Mori e considera que o momento exige que a população reaja. “As manifestações de rua são necessárias porque não há como suportar mais esse governo que nos mata de fome e de covid-19. Para tal, é necessário que se mantenha o distanciamento, máscaras de boa qualidade e álcool gel 70%. As aglomerações devem ser evitadas, claro, a menos que extremamente necessárias, como no caso das manifestações contra as medidas de retirada de diretos e que afrontam nossa sobrevivência”, afirmou.

Questionada sobre a possibilidade de realizar manifestações em meio à pandemia de covid-19, a epidemiologista e pesquisadora Denise Garrett destacou, nas redes sociais, que a “transmissão ao ar livre, ainda mais se usando máscara, é muito rara”. Ela lembra que a análise desse tipo de situação é dinâmica, ou seja, se for uma manifestação muito lotada, o risco aumenta. Mas destacou um estudo realizado na China, em outubro do ano passado, em que foram analisados 318 surtos, envolvendo 1.245 casos de covid-19, que comprova o baixo risco de transmissão da doença em ambientes abertos.

A pesquisa, publicada no International Journal of Indoor Environment and Health, destaca principalmente que todos os 318 surtos identificados que envolveram três ou mais casos de covid-19 ocorreram em ambientes internos. “A transmissão do SARS‐CoV‐2 de indivíduos infectados para indivíduos suscetíveis é principalmente um fenômeno interno”, destacaram os pesquisadores. Os relatos de casos foram extraídos das Comissões Municipais de Saúde de 320 cidades na China.

Também no ano passado, o Bureau Nacional de Pesquisa Econômica dos Estados Unidos analisou dados de manifestações do movimento antirracista #BlackLivesMatter (Vidas Negras Importam) em 300 cidades e não encontrou evidências de que os casos de covid-19 aumentaram nas semanas seguintes ao início das manifestações.

Transmissão é pelo ar

Desde o início da pandemia, vários estudos comprovaram que a transmissão da covid-19 se dá principalmente por dois meios: gotículas e aerossóis emitidos ao tossir, espirrar, respirar intensamente ou falar. Enquanto as gotículas caem rapidamente ao solo – e podem ser evitadas com o distanciamento de 1,5 metros – os aerossóis são leves e se espalham, podendo permanecer muito tempo no ar em ambientes fechados. Mas ao ar livre eles se dispersam rapidamente.

Os locais com maior risco de contaminação são restaurantes, bares, academias e igrejas. Nesses espaços, os sons do ambiente fazem com as pessoas falem mais alto – ou cantem, no caso de igrejas –, emitindo mais aerossóis. No caso das academias, a respiração mais forte durante o exercício tem efeito semelhante. Já no transporte coletivo, a lotação é o maior problema, pois leva a uma grande concentração de aerossóis e pessoas por longos períodos.

“Ao ar livre, o risco de transmissão é, principalmente, pelo contato próximo, face a face, por um tempo prolongado e sem máscara. Se você estiver ao ar livre, usando uma máscara de boa qualidade, bem ajustada ao rosto, por exemplo, a PFF2, mesmo que em alguns casos o distanciamento não seja possível, ainda assim, os riscos continuam sendo baixos. Acho que o ponto mais importante é se prestar atenção no deslocamento, no transporte coletivo, e aqueles momentos de interação, o pessoal se encontrando antes de ir ou depois de terminar, em interações sem máscara”, detalhou Mori.

Ações para manifestações na pandemia de covid-19

No último dia 13, manifestações contra o racismo e a violência policial foram realizadas em várias cidades brasileiras. Foi praticamente universal o uso de máscaras. Bem diferente das manifestações de apoio a Bolsonaro, onde o uso da proteção é, inclusive, criticado. No próximo dia 29, entidades estudantis, professores, reitores e movimentos sociais preparam atos de rua em defesa da educação. Os protestos devem ocorrer em todas as capitais.

Como destacado pelos especialistas, com uso de máscaras do tipo PFF2 e mantendo-se o distanciamento entre os participantes, o risco de transmissão da covid-19 em manifestações é baixo. Isso demanda boa organização dos movimentos, grupos ou partidos que propuserem os atos, para evitar que haja aglomerações durante os atos. A distribuição de máscaras PFF2 ou N95 pelos organizadores pode auxiliar aqueles que não dispõem de recursos para adquirir por conta própria. Oradores devem permanecer de máscara enquanto discursam, mesmo em cima de caminhões ou trio-elétrico.

Dia e hora

O horário da manifestação também pode fazer diferença para a contaminação. Como a maior parte da população se desloca por meio de transporte coletivo, marcar o ato no horário de pico em dias úteis colocaria mais pessoas em risco, com a superlotação de ônibus, metrôs e trens. Esse ponto também deve ser considerado para a dispersão dos manifestantes. Quem puder, deve dar preferência a ir ao local do ato em transporte individual.

Os participantes devem utilizar a máscara PFF2 ou N95 já no transporte coletivo. Esse tipo de máscara pode ser utilizada por até 6 horas seguidas. Todos devem portar, pelo menos, uma máscara reserva.

Os participantes não devem realizar nenhum tipo de confraternização antes, durante ou depois das manifestações. Uma ida a um bar para beber, mesmo após o protesto, pode jogar por terra todo o cuidado tomado na manifestação.

Durante o protesto, quem precisar comer ou beber água, deve antes se afastar das concentrações, limpar as mãos com álcool 70%, para só então tirar a máscara. O ideal é retirar totalmente a máscara e não deixar a proteção somente abaixada no queixo, pois pode haver contato de áreas contaminadas da máscara com a boca. Comer ou beber junto ao vendedor, no meio da aglomeração, ou conversando, eleva muito o risco de contaminação. Se possível, leve alimentos de casa.

Fonte: Rodrigo Gomes/Rádio Brasil Atual

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